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17-02-2008

O climatério -- continuação, final, por Nicolas Rouquette


Link primeira parte -- Clique abaixo.
http://attu.typepad.com/universo_anarquico/2008/02/climatrio.html

Chegavam os surfistas com o amanhecer, os pivetes do Arpoador, os primeiros vendedores de mate-limão-olha-o-mate-gelado-é-o-mate. O contraste entre o início de um dia e o fim de sua capacidade de procriar fez com que Joana buscasse a caxinha de Kleenex© que guardava sempre ao lado da cama. Chorava por auto-piedade, que feio para uma mulher que havia sido tão forte.  Deixou que as lágrimas escorressem do nariz sem fungar. Sua noção de suor em vez de sangue, de secura em vez de umidade a induziu a deixar as lágrimas correrem. Como e onde quisessem.
Pensou na Hillary Clinton. Era sua diva. A Hillary, que faria se o Bill saísse por aí com bebezinho de colo todo bobão? E se Hillary não tivesse sido sábia e tido a Chelsea? Espremeu o Kleenex fungado. Estava aí na manhã de sábado, cheia de contradições, incertezas e copos sujos de vodka com caroços de azeitonas.
Joana levantou-se, afinal. Olhou-se no espelho. ia descer e descolar unzinho e um surfista. Se não, o vendedor do mate. Qualquer coisa do amanhecer que a fizesse esquecer do seu crepúsculo feminino.

Tomou uma vitamina, duas aspirinas, um Engov©.  Escovou os dentes, o cabelo, ajeitou a cara e vestiu seu biquini e um sarongue.  No elevador deu de cara  com um vizinho que jamais havia cumprimentado. Disseram bom dia. Era um coroa -- e ela era o quê? -- um pouco cheinho mas alto, bem alto. Paulistano. Trabalhava na Internet. Coincidência, ela também. Desceram juntos. Iam ambos para a praia. Foram para a barraca da Tia Maria. Marcos não era nada mau de corpo. Como nunca havia reparado no seu porte antes, Joana? Ela se beliscava. Ele estava paquerando, era evidente. É o que fazem paulistas no Rio. Conversaram horas a fio. O sol a pino lhes disse que era hora de voltar pra casa.

No elevador de volta, o amasso foi inevitável. A decisão de onde parar foi feita em um átimo de segundo: a casa dele estaria mais arrumada. Joana estava excitada com a perspectiva de um romance, mesmo que fosse passageiro. Tinham muito em comum. Até os laptops eram Apple! Marcos a despia com seus olhos enquanto seus dedos hábeis buscavam a terra do desejo de Joana. Que secura que nada. Joana latejava, escorria, mas como climatério? Bobinha, não era mais fecunda mas mantinha seu desejo. Subiu no corpo de Marcos como uma salamandra ensandecida. Agarrou-se no portal, facilmente equilibrada pelo seu paulistano, nem que fosse seu por momentos. Gritou que era mulher, mulher, mulher, o mundo acabou por uns instantes e os dois esgotados caíram no chão.

Joana compreendeu que não teria filhos, ou surfistas mas poderia ter a felicidade do gozo e companhia masculina. Marcos admirava sua vizinha carioca, coroa sarada, e há tempos queria conhecê-la. Conseguiram ultrapassar a fase tesão, entrar na fase companheirismo e estacionar aí. Juntaram seus pertences, Joana parou de beber vodka porque suquinho da vida é muito melhor para a pele e para a saúde. Marcos e Joana viveram uma meia-idade confortável, com a renda do apê da Joana de quebra, longas discussões sobre cinema dos anos sessenta, psicologia, Lacan e Freud. Não tiveram nem filhos nem netos que os atrapalhassem nos seus estudos do sexo tântrico. Viveram felizes até a senilidade e depois. A senilidade nada mais é que a felicidade forçada em mentes embotadas e corpos lassos.

Nunca souberam quando um ou o outro morreu pois foram para casas de convalescência separadas. Joana sempre manteve sua relação com o mar, suas  marés, fluxos e refluxos. Climatério. Desejo e dor. Paz, enfim.Alvorada_arpoador


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Comments

Daniela Mann

Tina, minha amiga, voltei!
Tentei responder ao seu mail por diversas vezes mas volta sempre para trás! Mudou de e-mail ou estará com a caixa de correio cheia?
Diga-me qualquer coisa para depois poder escrever-lhe e voltarmos às nossas conversa, das quais estou cheia de saudades. :)
Um abraço apertadinho

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