« links for 2007-10-16 | Main | Tanto amor e paz para dar, tanto spam ;P) »

17-10-2007

Universo anárquico sou eu, por Nicolas Rouquette


A maioria dos meus leitores cai aqui e flutua na sugestão do(s) significado(s) de universo anárquico. Ninguém gosta de ser rotulado. Nem de maluco, nem de bipolar e nem de nada. Certos rótulos são inevitáveis; outros são cruéis. Já me auto-rotulei gringa, macumbeira, animista, judia, libelu, lulista, petista,católica, espiritual, democrata clintoniana. Minha fama de treteira me precede e precede o tempo da minha criação universo anárquico. No primário, embora primeira aluna, formei na quinta série sem segurar a bandeira nacional "porque não é brasileira." Levei bofetada no Institudo de Educação. Era ruim de bola. Fui pária no Santa Pústula reino das patricinhas. Fazia o  científico para engenharia, paraíso das tribufus.
Sou nada, uma ilhota no grande mapa do Andre Dahmer, sou gente e meu universo anárquico tem o propósito de documentar minha família, muitas paixões ao longo dos anos, estórias, poesias, filmes. É uma narrativa espiralada, repetitiva, feita para as pessoas que buscam respostas.  Das pessoas que me descobrem, algumas se vão outras ficam.

Aqui na California, na escola primária onde ensinei dez anos, fui rotulada de brasileira embora me considere americana. Assim:

--Vamos embora, Fulana. Você não vê que brasileiro sempre tem razão?--

A autora da frase lapidar era gringa e tinha morado um ano na USP. Sabichona.

Que eu saiba, mania de brasileiro é anunciar que vai tomar banho ao combinar saídas. No telefone lá vem o:

-- Então tá. A gente se encontra no Jurássico às nove. Dá tempo. Vou tomar um banho...--


Não gosto de rótulos embora seja inevitável rotular por amor à brevidade. Viva os achismos e generalizações simplificantes. Enquanto gringa, vou bem aqui: somos individualistas, os brasileiros são tribalistas no sociologuês. Quem somos, o universo anárquico e eu?

Somos tributo ao gênio José Oiticica, o tio Cajuza da minha mãe, pai de: Selma, Sônia, Vanda, Laura, Dulce e do gênio entomólogo, matemático e fotógrafo, José Oiticica Filho. Este teve três filhos: César, arquiteto, pai do César que conserva a obra do Hélio Oiticica, Cláudio, que é médico, e o Hélio, pai da Tropicália, um penetrável, uma espécie de instalação, em 1968, no movimento artístico mais memorável do Brasil desde a Semana de 1922, fonte da antropofagia, do modernismo, dos irmãos Andrade e de Tarsila. Somos tributo ao Senador e seu filho getulista, meu avô, Franciscos de Paula. Somos tributo a todos os Oiticicas e suas estórias de vida que tento documentar enquanto os primos mais velhos morrem.
A Oiticica especial é minha mãe, Josephina, Zefina, Zefa, Jo. Dela herdei a resiliência. Está com 87 anos, com momentos de rappeler e souvenir. Recordar e lembrar.
Uma das primeiras advogadas na Faculdade Nacional de Direito, ano de 1946, formou a maior parte de mim. Os estudos, a mágoa, a bipolaridade.  É católica freira de convento de um frade só. Multilíngüe, fonte principal das minhas estórias aqui. Até hoje diz que o Celso Oiticica, ex-piloto da FAB e desportista ímpar no Flamengo, é o mais bonito da família.  Disso ele vai gostar de ouvir.


Somos um universo, meu relato diário e eu, porque acho país uma besteira ainda mais nesse tempo de globalização. Meu marido é arquiteto de software no Jet Propulsion Lab. Já tem sua super-fama no laboratório. Homem depois do êxito profissional vira Jack Bauer. Estamos duros por causa do financiamento da casa própria. California é um drama, mesmo. Nicolas, do sul francês, é um Rouquette, nome que pagou muita zoada lá e aí no Brasil. Já vive plantado no universo desde o Deep Space One. Sim,tem nome: Nicolas F. Rouquette. Está indexado em "Remote Agent."

O Harris vem do grego Zaharis, que quer dizer doce. Somos todos diabéticos. Minha avó veio para cá bebê, fugida da Rússia. Meu pai foi primeira geração USA, sou segunda e Gabi ou GHR, terceira. Gabi quer ser Gabriel Francis Leite e Oiticica Harris-Rouquette.  E mandem todos os objetos de consumo de lambuja. Também quer ser engenheiro de programação para o espaço. Já vive lá, ao som da sua fatídica banda fascista.

O Rouquette deu problema, mudei para Oiticica. Já fui Cristina, brevemente. Aqui sou Maria C.

Minha história de vida registra aos poucos e muitos a criação de uma persona, a Tina Oiticica. Ela é um amálgama do anárquico no sentido de ausência de filiação a dogmas e de um universo extremamente pessoal de 55 anos de vida. Uma fusão de rock e samba, futebol, gringolândia. De recordações falsas ou reais, do rappeler e do souvenir. Recordar e lembrar. Sou eclética e fiel a mim mesma. Bamba na matemática tal os Harris todos. Luto contra o ranço do rancor.

Minha pessoa é tímida, receosa, ávida para ter aprovação dos seus pares. Chega uma hora em que a gente pira e desiste. Ninguém é perfeito. Gosto do que faço. Não tenho superpoderes. Sou esforçada. Trabalhei muito. Agora dou um taime.  Tenho que tratar da minha saúde física e mental.

Comentários? Cartas para a redação? No problema. Este post vai estar abrindo o meu testemunho intercontinental até que crie um "about me" melhorzinho. É só esperar pelo Nic. O tecedor-mestre da Tina reinventada nesta vida recente no Universo Anárquico. Agradecimentos ao Edney e à Alê Félix, pessoa bem mais velha que eu, emocionalmente.  Aos meus amigos daqui e de fora de aqui. Lá no Barzinho 42.

--Tina Oiticica, Universo Anárquico
screenlover@mac.com
http://rpc.technorati.com/rpc/ping




Sphere: Related Content

Comments

_Maga

“Nunca sabemos quando somos sinceros. Talvez nunca o sejamos. E mesmo que sejamos sinceros hoje, amanhã podemos sê-lo por coisa contrária.”

Fernando Pessoa in Livro do Desassossego através de Bernando Soares

" ... Mas eu só queria saber neste mundo quem concorda consigo mesmo! Somos misturas incompletas, assustadoras incoerências, metades, três-quartos e quando muito nove-décimos. Até afirmo não existir uma só pessoa perfeita, de São Paulo a São Paulo, a gente fazendo toda a volta deste globo, com expressiva justeza adjetivadora, chamado de terráqueo.
Mesmo cientistas já afirmaram isso também. Desde Gley, Chevalier e Fliess se desconfia que de primeiro os seres foram hermafroditas. Antes desses senhores, Darwin estivera escrevendo coisas pros leitores inteligentes do tal globo terráqueo e desde então se começou falando em seleção e outras espertezas que permitiram este saborosíssimo cisma em seres imperfeitos machos e fêmeas imperfeitas. Que invento admirável o cisma!
(...)A tanta ciência e tão pouca anatomia, eu prefiro aquela ideia contada pelo padre Pernetty: "Les Femmes ont plus de pituite et les hommes plus de bile... Certains philosophes ne craidraient pas d'afrimer que les femmes ne sont femmes que par un défaut de chaleur". E se quiserem coisa ainda mais grata, é lembrar a fábula discreta contada por Platão no Banquete... Porém o que importa são as afirmativas daqueles alemães sapientíssimos, aqui evocados para validar a minha asserção e lhe dar carranca científico-experimental: NÃO EXISTE MAIS UMA ÚNICA PESSOA INTEIRA NESSE MUNDO E NADA MAIS SOMOS QUE DISCÓRDIA E COMPICAÇÃO.
O que chama-se vulgarmente personalidade é um complexo e não um completo. Uma personalidade concordante, milagre! Para criar tais milagres o romance psicológico apareceu. De então, começaram a pulular os figurinos mecânicos. Figurinos, membros, cérebros, fígados de latão, que, por serem de latão, se moveram com a vulgaridade e a gelidez prevista do latão." Mario de Andrade, Amar, verbo intransitivo

"... não que eu fosse ingênuo a ponto de lhe exigir coerência, não esperava isso dela, nem arrotava nunca isso de mim, tolos ou safados é que apregoam servir a um único senhor, afinal, bestas paridas de um mesmíssimo ventre imundo, éramos todos portadores das mais escrotas contradições, mas, fosse o caso de alguém se exibir só como pudico, que admitisse nestas exibição, logo de partida, a sua falta de pudor, a verdade é que me enchiam o saco essas disputas todas entre filhos arrependidos da pequena burguesia, competindo ingenuamente em generosidade com a maciez das suas botas, extraindo deste cortejo uns fumos de virtude libertária, desta purga ela gostava, tanto que se purgava ao desancar a classe média, essa classe quase sempre renegada, hesitando talvez por isso entre lançar-se às alturas do gavião, ou palmilhar o chão com simplicidade das sandálias, confundindo às vezes, de tão indecisa, a direção desses dois pólos, sem saber se subia pro sacerdócio, ou se descia abertamente pra rapina (como chegar lá gloriosamente?)" p. 40-42, Raduan Nassar, Um Copo de Cólera.

_Maga

Ahhh desculpe o comentário confuso...

são comentários que falam da contradição humana, e do quanto ela é comum a todos...

adoro o assunto!

beijos

tina oiticica harris

_Maga:

O technorati não me deu ping. Levei horas para escrever este post sem referências. Precisava desabafar que existo.
Gostei muito do comentário do Raduan Nassar sobre a classe média. Aliás, sobre tudo.

Pode ser que seja um momento em que ache que sou tr00. Enfim. Muito obrgada pelos comentários ,claros e incisivos.

marcus

Que post ótimo, Tina. Adorei tua história, explicando teus nomes e sobrenomes.

tina oiticica harris

Puxa, Marcus; mais ou menos escrevi com a tua mente analítica ligada porque não gostas de leituras longas desconectadas.

Ou seja, estou feliz que o mestre alepha aprovou ;P)

Marcos Jorge

Acredito que a incoerência faz parte do ser humano. Já imaginaram um ser uniforme em seus pensamentos, em suas ações. Leio seu blog todos os dias, apesar de não fazer comentários, porque acho vc um ser humano completo. Autêntica,incoerente, coerente, botafoguense.Louca? Depende do referencial.

Marcos Jorge
Flávia Nogueira

Tina, também gostei muito desse seu post EU. Foi inusitado! E sabe de uma coisa? Sempre achei que vc é Tina mesmo, nunca pensei que fosse apelido! Estranho, pois geralmente fico ruminando nomes.
Beijão

marilia

Cara, nem sei o que vou falar. tanto desabafo, tantas pessoas na história, e vc.
Te encontrei gostei, e fiquei.
Sem saber de onde vc veio, e pra onde vai.
Tina, vc é uma figuraça, e fui me aconchegando, escrevendo,skaipando...
Formadora de opinião, dona Zefa te criou bem.tem amor, cara, muito amor nesse seu post!
Oiticicas, helios , Zefas e tinas, nesse anrquico universo, vc faz jus ao sobrenome, sem rotulos.
gente boa, sangue bom.
um bjos. te chamo de amiga.

The comments to this entry are closed.

Google

Twitter Updates

    follow me on Twitter

    Amigos do Universo Anárquico℠

    Foto Flickr

    • Pedra do Arpoador,Ipanema, Rio de Janeiro
      www.flickr.com
      This is a Flickr badge showing photos in a set called Pedra do Arpoador,Ipanema, Rio de Janeiro. Make your own badge here.

    Last.FM

    Universo Anárquico℠ Blog Roll