As danadas das batatinhas, por Nicolas Rouquette
Era um restaurante fino que havia conhecido melhores dias, assim como o centrão de São Paulo, capital. Não sei se era o Sujinho, ali na Ipiranga. Servia filés caríssimos com repolho para seus fregueses, a maioria burguesa, de várias papadas e muitos cartões no bolso, suando em bicas no calor das lides das batalhas financeiras e caôs. Burguês curte repolho pois já cagam e andam pro povo mesmo.
Os garções vestiam-se tradicionalmente, com gravatas borboletas, roupa branca imaculada, cabelos brilhantinados, curtos, às vezes um bigodinho-lápis. Se estivessem com paletós negros passariam por mafiosos, fácil.
Pois um dia, a meia hora do fim do expediente de almoço entra um desses burgueses que não duraria vivo nem meia hora depois de chegar no aeroporto no Rio. Pele brilhando de suor, voz tronituante, o burguesão chamou por um garçom. Sacaram que a peça ia ser complicada e mandaram o Agenor, 40 anos de casa, uma fineza de fazer corar o Itamaraty por sua falta da mesma.
--Sim, senhor? Gostaria de saber quais são os pratos do dia? Talvez tirar o paletó? -- Agenor era cortês sem ser vaselina.
--Vamos logo com essa joça. Quero um bife a cavalo ao ponto, arroz e feijão, feijão do lado, salada de alface e tomate e batatas.
--Que tipo de batatas, senhor? E para tomar?
--Batatas, ora! Ao vencedor as batatas! Batatas fritas. Um chops.
O restaurante ia fechar para limpeza e fazer os preparativos do jantar (cedo, pois é centrão de SP.) Pedidos a essa hora estavam pra lá de devagar; não eram prioridade. Só que o burguesão pidão grosso e mandão estava com fome que pãozinho não tapeava. Não deu dez minutos e ele berrou pior que bezerro desmamado:
--Garçom, cadê a droga da salada!
Vem Agenor com uma salada feita às pressas. Outros dez minutos e lá vem o Pavarotti de Higienópolis:
--Garçom, e a porra do arroz com feijão!
Lá vem Agenor com arroz e feijão temperados com uma cusparada, pois em restô é assim, ambos meio frios.
Mais quinze minutos e a ópera recomeça:
--Garçom, esse bife a cavalo, caralho, vem ou não vem?
Antes que dessem quinze minutos para mais uma gritaria do Rockefeller do Tatuapé, acerca-se dele o Agenor, calmo e suave enquanto o burguês sua mais ainda, bufa e luta com os talheres, pois na verdade tinha subido na vida dando como se pode, lá de Osasco.
--Com licença, senhor. Ainda vai querer as putas das batatinhas?
(Pano rápido)
Com vocês futebol da Ana Paula.
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Hahaha... valeu a pena esperar pela história das batatas :D :)
Posted by: Gabriela | 08-07-2007 at 17:53
Gostei da história e das fotos...
Posted by: Donizetti | 09-07-2007 at 20:25