Mommy se despede, por Nicolas Rouquette
Já fui como todos os jovens. Rebelde, achava que de tudo sabia mais. Respeitava minha mãe, admirava sua beleza, força de vontade, energia. Achava que eu sabia de tudo porque estava a par da revolução ( que revolução?)
Hoje estou com a idade que tinha minha mãe na época da "revolução." Minha mãe chega ao fim. Nicolas acompanhou o fim de sua avó. Ele reconhece os sinais. Uma certa paz no semblante. Um sorriso constante que tem um nome do latim que esqueci. Minha mãe fala certas coisas sem pensar, para livrar-se da pergunta. Outras ela sabe o quê diz. Quando não quer alguma coisa diz, como dizia aqui em casa: --Bye, bye! Diz que a comida foi boa embora não saiba mais o quê foi. Quando diz não é não. Gosta da casa de convalescência; ela tinha razão, ninguém tem alta desta casa. Se convalesce é a alma que parte, se alguém acredita nessas coisas.
Nicolas diz que é como se uma torneirinha se tivesse aberto no seu cérebro e goteja pouco a pouco, retira a vida mental de Mommy até o fim, quando ela desaprender de vez os rituais da vida. O social já era. Minha mãe, que declamava para doutores amigos de seu pai, diz não , sim e bye-bye.
Aniversário de Zefa, 29/2/2004, fim da químio e radiação do cêancer de mama que a atacou em 2003.
Nicolas é forte porque é francês, sua mãe morreu quando ele tinha sete anos, sua vó quando ele tinha quinze, de demência também. E é engenheiro, já disse pra vocês que engenheiros lidam com emoções de maneira sui generis.
Eu choro. Há uma enchente de memórias da minha mãe formando torvelinhos de imagens e frases dela --Honeyzitiquito -- uma palavra inventada de honey e zitiquito, um super-minúsculo que denota carinho. Ela voltou a usar o honeyzitiquito com Gabriel, seu chou-chou, seu netinho. Naquele tempo eu trabalhava, ela ia pegar o Gabi na babá, levava-o na biblioteca --os livros sempre seus amigos-- e depois ele ia ver os filmes do tempo do Onça, na casinha dos fundos, a dela, John Wayne e cavalos, brincava com caixinhas plásticas de iogurt, a gente tava pobre, era tudo coisa usada.
É triste ver uma pessoa que foi tão brilhante e hoje é uma casca quase vazia, cada vez mais vazia, até que chegue o fim. Pelo menos posso dizer que minha mãe teve uma vida boa aqui com a gente. Não teço loas a mim mesma. Acho que a gente faz o que pode pelos progenitores. Quê seríamos sem aquele encontro especial de um espermatozóide e um óvulo?
O espermatozóide veio uma cidadezinha gringa; Grécia nos EUA. O óvulo precisou esperar por uma cirurgia de retirada de um ovário e metade do outro, tratamento clássico para endomitriose. E assim fez-se esta blogueira com orgulho da profissão, que hoje escreve um post diarinho, perdoem-me, é o post # 304 deste blog. Estou batendo quase 300 leitores e quase 40 assinaturas. Acho muito legal, considerando que isso aqui, o Universo Anárquico e o Anarchic Universe, é gosto adquirido. E vocês que gostam, divulguem o blog, por favor. a-t-t-u.typepad.com/ Só isso.
Meu post sobre "Dirge" do Bob Dylan tá lá na Lágrima.
Este ficou bom mesmo. Tem um pessoal meio hostil mas tudo bem. É como se eu escrevesse para a Rolling Stone mas não gostaria de escrever pra RS.
Quem sabe amanhã eu escrevo a parte dois dos Classificados e uma aula sobre Technorati. Estou com trinta links que não estão contando no Technorati por uma razão ou outra. Não sou do tipo de blogueiro que nem liga para o que escreve, só pra juntar link. Não é o caso. Mas já que tem o nome do meu blog na lista, deve estar no Technorati.
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Ei, Tina. Saudades.
Difícil imaginar a situação pela qual você passa, e igualmente difícil não ser tocado de alguma forma. É um caso incomum e - poxa - triste à beça. Só posso ter a certeza de que você é a pessoa certa para segurar a barra com seus dois garotos. Força pra você.
Abraço.
Posted by: Ed | 27-03-2007 at 06:37
Obrigada por suas sinceras palavras. Infelizmente minha geração tem um monte de gente ensanduichada, entre filhos e progenitores. Quanto mais se vive mais periga pintar Alz. E infelizmente parece que dá muito nos Oiticica.
A gente faz o que pode. Obrigada pelas palavras carinhosas do geralmente insouciant de BH.
Posted by: tina oiticica harris | 27-03-2007 at 08:21
Tina, estou a dar-lhe um abraço apertadinho de amizade sincera!
Muita força e coragem, que aliás, a bravura é consigo!
Beijinhos
Posted by: Daniela Mann | 27-03-2007 at 12:59
Tina, eu tive que dar um jeito de escrever aqui, apesar das restrições À internet no trabalho. Muito bonito este seu texto. Comovente, mesmo. Pronto. Agora preciso ir. Beijo.
Posted by: Cláudio | 27-03-2007 at 13:10
Minha avó também foi assim, teve cancêr, combateu com químio, mas após dois anos ele voltou, era no sistema linfático.
Duro mesmo foi ver ela delirar dois dias sem parar antes de morrer, se retorcendo toda e não reconhecendo mais quem estava a sua volta.
Mas antes disso estava lúcida e era muito carinhosa (e mulher forte, como todas em minha família).
Foi essa imagem que guardei dela, da mulher carinhosa que sempre me incentivava e estava do meu lado para o que desse e viésse (sempre mesmo, até quando nem meus próprios pais botavam fé em mim).
Belo texto...
Beijos, :-*
Posted by: hazzamanazz | 27-03-2007 at 21:14